sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Terra, água, fogo e ar!

Eu era uma menina. Eu confundia paixões. Experimentava a sensação real de que poderia alçar vôos de liberdade. O cheiro de tudo me agradava, brisa batendo no rosto trazendo aquele aroma de mar amanhecido, chuva na terra (esse cheiro de gosto universal), cheiro de ar puro rodeado por árvores. Eu sentia uma vontade imensa de viver, lia e me maravilhava com cada texto, fazia as refeições e adorava o que comia, eu descia até a praia e nadava braçadas largas por aquele mar, a água era morna, leve, me dava o cansaço necessário, nem mais, nem menos, saindo da água era só pousar os olhos naquela paisagem para recarregar e seguir o dia.
A seguir era encontrar com ele, e eu estava apaixonada pelo dia, por mim, mas confundia a paixão por ele. Quando a gente é jovem, confunde que a paixão, deve ser direcionada pra fora, pra uma pessoa com quem se queira uma relação. Eu relevava palavras duras, relevava determinadas atitudes agressivas, acho que para não desmanchar todo o resto que eu sentia envolto pela paixão do dia. Duas vezes por semana, ele chegava já tarde da noite, eu aproveitava pra assistir algo legal na TV, prolongando minha diversão; quando ele chegava, eu me iludia que estava morrendo de saudades, mas na verdade, eu estava muito bem ali sozinha.
Foi pela paixão, misturada à ilusão e confusão que me decidi: é por aqui que eu fico! Tenho certeza que tomei a decisão por causa das liberdades e paixões comigo e com a vida, mas embolei e coloquei ele no meio da decisão. Fui, arrumei minhas coisas na velha, enorme e inóspita São Paulo, me desentendi com ele, mas mesmo assim mantive o foco de que era pra lá que eu ia - pra lá pro meio da mata, onde o mar bate de mansinho na areia. Mudei pra casa de um amigo, mantive a grande paixão comigo (quase que o retorno pra capital me apaga ela, mas reviveu), dessa vez eu andava de bibcleta mirando a orla, visitei praias que eu não conhecia, vi lindos entardeceres da varanda, vi saíras e capivaras. Já no trabalho, fazia um percurso delicioso de bicicleta, com vista para as montanhas, o rio chegando no mar, brilho do sol citilante nas águas. Até quando chovia era uma delícia morna. Nada daquilo se assemelhava ao trânsito brutal em SP, meus choros no ônibus parado na cidade, sem previsão de andar e eu atrasada pra chegar. Rio? Só aquele poluído, fedido, que exalava tristeza. Na nova vida, até mesmo meu trabalho me transbordava, até que enfim estatutária em um caps, onde planejei trabalhar desde o fim da faculdade.
Eu era jovem e iludida, eu achava que o que me preencheria de verdade era o amor "verdadeiro", e ele veio pedir desculpas, nos reconciliamos e iniciamos namoro, coisa séria. Por ser sério, eu ouvia um tanto de coisa e não podia um outro tanto, era inaceitável, ainda mais com toda a liberdade que eu estava experimentando, mas para não ruir o que eu entendia por felicidade, logo após discordar, eu acatava. E fui me definhando. A própria cidade foi se mostrando horrível, uma violência urbana enorme, pessoas morrem toda semana, quiçá até todo dia. o trabalho já nao tinha mais brilho, entre tantas coisas, uma chefe impertinente, a luz do sol na água perdia brio.
Durante a gestação, meu amor foi re-direcionado pra aquela que escolheu crescer no meu ventre, e que felicidade isso era! Parto, pós-parto, exoneração, violência doméstica aumentando (nunca houve violência física, mas como doíam as violências psicológicas e verbais!). Fim do casamento
Sem trabalho, com uma filha pra criar de maneira amorosa, com apego sem delegar funções, me perco mais uma vez em ilusões... Mas hoje eu senti de novo aquela faísca de paixão. Foi na rotina da manhã, trocando a água das galinhas, respirei aquele ar puro rodeado por árvores na beira do rio, terra molhada de chuva, brisa de mar amanhecido. Era eu comigo mesma, não vou me iludir dessa vez, sou mulher madura!

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